" Disseram-me que estiveste triste no outro dia. Por que é que estiveste triste? "
" Porque sim. "
" Isso não é resposta. "
Pois bem, e que resposta será considerada fiável e correcta à pergunta "por que é que estiveste triste?". Antevejo tantas possíveis respostas, e observo-as em disposições completamente aleatórias: respostas explosivas, demolidoras, ambíguas, sucintas. E eu não me senti com capacidade para escolher a mais certa, a que revelava a mais fiel aproximação à verdade e, vista perante tal pressão, e quando digo pressão refiro-me aos sussurros contínuos e impreteríveis das minhas vozes que me alarmavam: "passa-se muito tempo, e tu tens de dar uma resposta", o que me prova de que o tempo, de facto, não é igual para todos, e que o meu relógio não anda à mesma velocidade do da cantina do colégio (e não me encontro com disposição para atribuir maior relevância à palavra colégio comparativamente a todas as outras palavras inseridas e disponibilizadas neste monólogo), talvez por culpa do quartzo, o meu talv ez seja de menor qualidade, ou de uma qualidade diferente, não menor, não maior, talvez uma outra palavra que eu ainda não conheça. E por que razão é que algumas respostas não são consideradas respostas? Qual seria a resposta mais segura, mais aceite pelo inquiridor à pergunta: "por que é que estiveste triste?". Não é justificável, visto que para o amor já não temos de apresentar respostas que sejam consideradas respostas, e para a tristeza as não-respostas já não servem. Temos de fundamentar, revirar os olhos, soltar aquele suspiro de quem pensa que o outro não compreende, não é capaz de compreender; mas no fundo sabemos que sim, até compreende. Porque no fundo, aquele fundo que ninguém sabe lá muito bem qual é, nesse fundo onde estamos todos, amontoados em camadas de gordura, como pequenas espinhas parasitas que tornam o meu frágil cabelo ainda mais gorduroso, nesse fundo batemos contra a parede, tais peixes cegos em tanques sujos, os esquecidos que não lembram a ninguém.
Isso de respostas dá muito que falar, ou melhor, pensar. Pensar conforta-me e faz-me sorrir. Principalmente quando penso e o vento pensa comigo, e até sorrio quando ouço as vozes a chamarem por mim. Não vozes, vocês já não me assustam. O que me assusta vai sendo menos, e por outro lado mais, e isso não é lá muito bom, porque eu aprendi que menos com mais dá menos, e é com esta falsa esperança de concluir a equação com a solução certa que prossigo. Não posso estar sozinha com todas estas palavras a rodearem-me e a protegerem-me. Odeio-me por desprezar a coisa que mais amei até hoje. Depois disso até sou a pessoa mais feliz do mundo. Com franjinhas, sem franjinhas, tenho sempre aquele nariz com osso mais, aqueles olhos dilatados, ou semicerrados quando faz vento, aquela expressão de quem vive ou morre, como se isso nem importasse muito. Como se fosse tudo mais do que simples expressão. Como se hoje acordasse e o mundo fosse meu.
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